A música e as palavras fazem parte de mim.
Quero ouvir, dividir e respirar música...
e as palavras que dizem, quero-as como pinceladas alegres ou amargas, luminosas ou escuras, quero-as verdadeiras...
existem palavras para dizer os sentires do peito mas melhor é que fiquem no silêncio, que deixem as notas musicais escreverem o sentimento...
Jazz
Jazz
num solilóquio azul, borboletando por dentro a música pinta divagações e improvisos em telas irrepetíveis...
Jazz
Jazz
o lamento dos algodoais, a embriaguez nos bares de New Orleans , o chocalhar das correntes nos tornozelos, a voz dopada junto com o ronronar do saxofone e a guitarra dizendo seriamente da alma
Jazz
Jazz
misteriosa linguagem esta, feita a cada momento, recriando-se sempre a volta dum mantra harmonioso que nos emociona e vicia, nunca se repetindo
Para chegar ao Muquifo ele tem de descer umas escadas íngremes sob a sombra duma mangueira portentosa.
Abre o cadeado da grade de ferro, roda a chave da porta e o seu pedaço de intimidade lhe dá as boas vindas.
O melhor dos mais lindos palácios está ali, logo que a porta se fecha a tranquilidade e a segurança correm, saltitam, pulam para o seu colo felizes por o receberem ...
A geleira sorri-lhe, o pacote de waffers de baunilha a meio ficou na mesa , repara que está tudo como gosta e como deixou ontem quando saiu para vadiar...
A mochila com o lap fica logo ali no sofá purpura da cozinha, já na casa de banho abre as torneiras e tempera um banho morno...
A caminho do quarto vai tirando a t-shirt , acende a luz, flita o quarto com o Baygon para garantir que mosquito algum lhe perturbe o sono e fica nu por dentro e por fora.
Apetece-lhe ouvir Alborosie e começa a cantarolar Dutty Road:
dem walk on dutty road, jah full a garbage bin and cockroach, jah
As luzes do Muquifo iluminam esta actividade registando para a posteridade os movimentos do resgatado, a calma e o prazer contidos em cada gesto rotineiro transformam a cena num bailado em slow motion.
O banho vai até esgotar a água quente, nesse banho ele simplesmente deixa de estar e se concentra no prazer da massagem , como mãos oleosas e quentes a água o relaxa mais ainda...
Descalço e de toalha à cintura põe água a ferver para cozinhar um spaggheti liga depois o lap ao sistema de som e Precious enche o espaço:
precious precious she's wining on me(lawd a mercy) precious rub a dub mi girl till da morning precious precious she's wining on me
Como as coisas simples podem ser tão prazeirosas e a convivência com ele próprio tão reconfortante!!!
Depois de ter percorrido o deserto das almas penadas montado no faustoso camelo alado do acreditar, pensava ele conseguir chegar a terra do entendimento, descobre agora no ocaso da vida que tal nunca poderia ter acontecido...
Percebe que não se pode chegar a lado nenhum se não conseguirmos primeiro resgatar o amor próprio.
O respeito em todos os sentidos da palavra; a afirmação da nossa essência, da nossa personalidade sem dúvidas. Entendeu finalmente que não se pode ser o que os outros gostariam que fossemos, que não podemos viver em função da vida dos outros . Ele acredita que sendo assim, verdadeiro e seguro de si que tudo ainda é possível. O amor, a paz e até a felicidade poderão ainda acontecer ....
O Muquifo fica na entrada da zona esquecida da cidade das acácias, fica ali onde a vida fervilha e as pessoas são feitas de luta e determinação, onde não existe espaço para lamentos, onde se cantam todas as odes à vida, todos os dias ...
A voz grossa de Alborosie sobe por entre os ramos da mangueira e consegue chegar ao último andar do prédio ao lado...
Ele dança ao som do reggae, o molho a bolonhesa já está quente, o resto do pacote de parmesão ralado ainda chega para esta refeição...
Enquanto dança de toalha a cintura agradece aos céus por ter sobrevivido, ele sente e sabe que nunca mais será infeliz, que nunca mais ninguém lhe fará chorar....
Na rua uma energia positiva vibra, um grupo de jovens na esquina conversa animadamente, do outro lado da rua na barraca da mãmã Isabel um trio sentado no passeio bebe e fala alto e as gargalhadas animam o fim do domingo...
Pardais voando no meio do cenário, carros circulando, muitos sons misturados, apetece estar aqui...
Maputo é bela, ela é especial e respira de modo totalmente diferente, não se compara a qualquer outro lugar, ela é ingénua e sorridente e todo mal que lhe estejam a fazer , nunca lhe tocará realmente, ela está noutro level...
O amor e paixão que ela desperta, a harmonia das ruas e das gentes, libertam um perfume de cidade mágica, cidade do impossível, cidade do óbvio, do ingénuo de novo....
Esta cidade que vaga em filosofias e estudos criativos tentando encontrar o cerne , querendo desabrochar, a contradição genuína que faz passar de 33º C para 22ºC num piscar de olhos, o que se diz nem sempre ou quase nunca se faz, celebra-se o dia a dia e o fim de semana é uma festa, festeja-se como soi festejar-se em ocasiões especiais...
Maputo o jardim centenário , a cidade de traçado inteligente vai ressurgindo do coma, do desmazelo e se instruindo, vestindo-se melhor, sem pressa , lentamente, com seus filhos alheados , enfeitiçados pelos poderes da bela, pela magia apaziguadora que ela irradia, eles vão inventando uma cidade de novo a se iluminar....
Maputo blues, sonho contigo, nos meus sonhos estou sempre aqui, nas recordações, em todas as projecções vividas e por viver... Maputo, meu sangue, meu amor incondicional, o estar em casa, sensação única ....
Último álbum do mestre dos Dire Straits, como o conhaque, maduro, apurado ....
Espelho meu, quem é a mulher mais indesejada do mundo?
O espelho responde:
- Não é você loira, é sim aquela morena toda bem feita, de corpo escultural mas com uma cabeça de minhoca...
Neste mundo de gente pensante ela não vai nunca conseguir encontrar o amor, apenas será devorada e não sobrará nada para além desse corpo todo cansado e desgastado...
Mesmo assim ela se desanca e se descabela porque o espelho reflecte o exterior que ela não aceita, que ela não quer para si e triste e arrasada ela se fecha na sua concha e fica bebendo cachaça atrás de cachaça...
Sentada na areia da praia ela esconjura o mundo, ela grita e reclama dos céus e só o marulhar e o luar lhe respondem com ternura muda, com o calor das não palavras...
Os pirilampos se aproximam e a ajudam a se levantar e iluminada ela volta para seu castelo de sombras...
As lágrimas lhe toldam a visão e não consegue encontrar a morada.
- Onde está a minha guarida?
- Esta não é , mas...
No lugar de sua casa iluminada está uma carruagem feita de chocolate e ao se aproximar a porta abre-se e um pajem belamente vestido lhe faz uma vénia e a convida a entrar.
Nervosa limpa com as costas da mão a face ainda molhada e receosa , querendo e não querendo se foi aproximando.
Sentada e com o coração batendo descomandado vê sair duma portinhola secreta um teclado e a janela á sua frente se transformar num monitor incrível, tridimensional, touch screen, etc.
Um génio vai saindo tipo fumaça e se materializando bem ao seu lado, enorme e bem cheiroso, cheirando aos incensos do Oriente das mil e uma noites.
- Loira, vou lhe fazer 3 perguntas e você vai ter de responder certo senão não sairá daqui e voltará para seu mundo amargo e sem esperança.
- Se acertar vou levar você para a terra do nunca, para a terra do jamais se estar triste.
- Aceita ?
Enchendo o peito até quase explodir ela depois descomprime e o ar sai de seus pulmões com tanta força e libertando um bafo a cachaça que o génio torce seu nariz e seus cabelos negros de azeviche esvoaçam cintilantes como só o ébano perfeito dos mágicos o consegue.
Apontando o dedo para o monitor , magicamente surge a primeira pergunta escrita em 10 dimensões, nunca antes se tinha visto tanta tecnologia mágica !!!
-O que é mais importante, o que você quer para sua vida ou o que a vida quer para você?
A loira sente o ar lhe faltando e a cabeça rodopiando e responde:
- O que eu quero para mim sem dúvida !!!
O sinal de certo surge piscando a verde no écran e o cantar de rouxinóis acompanham o banho de confetti de ouro real que vai caindo do tecto.
A segunda pergunta não demorou.
- Devemos desistir de perseguir nossos anseios, nossos sonhos, mesmo que tudo demonstre ser irrealizável e devemos aceitar os factos que parecem intransponíveis?
Ah, a loira não acha que deva perseguir sonhos ou mesmo acreditar que tudo pode acontecer mas como ela tem um amigo que passa o tempo lhe atazanando com o contrário se resolve sem hesitar.
- Nunca, jamais desistir !!!!
Um arco íris atravessa o céu sobre a carruagem e gazelas saltam por cima dos cavalos num espectáculo surreal, vozes angelicais cantam e afirmam:
" Acertou ! Acertou!
Só falta mais uma ! Só falta mais uma !
A loira procura no bolso da saia rodada a garrafinha de cachaça e se assusta pois lá dentro em vez da garrafa tem sim um sapo gordinho sorrindo para ela
O génio se enrola numa espiral de fumo e volta para dentro do monitor e uma voz portentosa lhe lança a última pergunta:
- Loira, você acredita em contos de fada?
Aí a porca torce o rabo, ela se levanta e já vai para sair, deitando fogo pelas narinas, pensa ela que está sendo alvo duma armação da televisão.
Abre a porta e se assusta porque está nos céus e as luzes da cidade estão pequeninas lá em baixo e se senta de novo rapidamente.
- Não, não acredito !!!
Grita rouca e consciente de que tudo vai terminar logo, que tudo não passa de uma alucinação etílica.
Um silencio gelado se instala e a carruagem se transforma num táxi velho e a caminho de sua casa que já se avista a alguns metros.
Paga a viagem e caminhando sem alento procura a chave que está pendurada num coração vermelho e não encontra, vira a carteira do avesso e nada....
- Perdi a chave e agora?
Desanimada empurra a porta e para seu espanto ela se abre sem ruído, sem o chiar nostálgico e tão conhecido do desconsolo de todos os dias...
Entra e repara que apesar de não ter ligado as luzes algo luminoso vem do seu quarto; em cima da cama a chave !!!
...mas no lugar do coração um papiro de ouro brilha com vida própria.
Senta-se na berminha da cama, receosa e sem perceber nada.
O papiro se começa a mover e um sábio, um ser feito de pureza extrema se materializa, vestido de tecidos nunca vistos.
Ele pega suas mãos com doçura e diz:
Moça, você respondeu tudo certo e como tal a vida não vai fazer você esperar mais, a vida não vai desapontar mais você, você vai ser amada e vai amar porque daqui para a frente o nunca e o jamais não existirão mais em sua vida
Não foi logo que esta declaração se tornou real mas a loira deixou de acreditar que com ela o amor não aconteceria jamais.
Passado uns tempos surgiu um individuo de carne e osso, belo e com cabelo preto como ébano, era fã de suas palavras e de suas poesias e ela simplesmente arrumou o computador, só o ligava para saber de seus amigos.
O tempo era ocupado com a vida real, com a amizade e o amor, com o companheirismo e a alma acalmou e sossegou.
O bass dando o beat e o individuo seguindo a passo e compasso
gin e manga juice escorrendo para as meninges sedentas
o feriado deixou um trilho de musicas pela cidade e elas ficaram ecoando , ecoando...
na boca da toca o narizito empinado fareja o sentido das coisas
uma pontada nas costas lhe avisa da perenidade de estar
da penumbra olha o verde das folhas da majestosa mangueira em flor
os sons planam ao nível do tecto, ele está submerso
a terra o rodeia, os grilos grilam a meio tom, trinam...
na cave o solilóquio vai profundo e a escuridão se aproxima sorrateiramente...
Faça-se luz e a musica se pronuncie....
Lá onde os sonhos ficaram pendurados em varais, se abram as cortinas e deixem a noite ser plateia ...
Tambores tocando , os arautos das vidas perdidas se fazendo ouvir em harmonias complicadas, desenhando mapas e notas musicais nas histórias infames dos desconsolados.
Tacteando , inalando aromas, olhando longamente acaba o insone provando o sabor salgado das coisas estáticas...
Coisas feitas de corações de pedra, de cores vivas escarradas no chão da ignomínia dos homens, lá onde não encontras o paraíso...
Rebusca e busca e encontra o mesmo, nada...
Falar de coisas alegres, de sorrisos e beijos de amor, falar das mãos dadas na berma da praia, falar do brilho no olhar de quem acredita, falar de ilusões, falar da espera eterna, falar em fé, falar...
Para quê fingir?
Lá na caverna, lá na toca, lá na cave a esperança tremeluz tal vela que pouco ilumina e o individuo não se agacha, não!!!
Sai da toca e ao clarão da noite de néon atira sarcástico e meio demente a pergunta lapidar:
-Podes me indicar oh noite interminável, como fazer para só vislumbrar um pouco desse tal de paraíso?
Obviamente que a noite não lhe responde mas mesmo assim aguça o ouvido, não vá a noite sussurrar e ele não ouvir...
Sentidos no âmago das cores dispersas, leves são meus suspiros e meus desassossegos sem rimas misturando os sabores , diluindo as mãos nas mãos encantando os olhares , olhares sem espelhos cristalinos embaciados de lágrimas doces , pétala a pétala com cuidado enquanto isso o vinho cor de sangue em vitral o copo torna cantos sagrados de vozes dos deuses na terra, sem devoção elevados aos píncaros da loucura não se despojam, nunca !!!
o pulsar do coração rimbomba dentro das praias ao longe a miragem grita surda enquanto sorrio para a lua amarelada em sépia deslavada foto encurvada como flores secas de papel plantadas na soleira de cal ao sibilar dos pássaros da tarde a sombra dança ao sabor do vento, ao sabor do amor que nunca acaba, brilha iridiscente e não fere...
esses livros escolhidos , pedaços de almas nebulosas despojos da dor e da lucidez são portas, são buracos negros altares de flores brancas, de aguas perfumadas de incenso de jasmim o mel e o bom whisky velho , as especiarias preferidas , o fumo adocicados sabores e flautas de pan embalando os véus no encontro dos sentidos somos ateus e inventamos cultos lá, onde não se lembra mais nada fica a ilusão perfeita fica o mistério do indizível,sossega a alma em alvoroço
A partir do contacto estreito com as bandas pós- punk e new wave da editora Factory, tais como Joy Division, New Order, Durutti Column ou The Fall, aquando da sua estada no Reino Unido, «MEC» (como era conhecido pelos fãs), deu-se a conhecer como autor de crónicas sobre música pop, publicadas nos jornais Se7e, O Jornal (actual Visão) ou Música & Som, avidamente lidas pelos jovens portugueses, em complemento à transmissão dessa música em programas como Rock em Stock, de Luís Filipe Barros, ou Rotação, Rolls Rock e Som da Frente, de António Sérgio, na Rádio Renascença e na Rádio Comercial.
Nessa época, dedicou-se também à crítica literária e cinematográfica, no Jornal de Letras, Artes e Ideias
Começou igualmente a ser presença assídua na rádio e na televisão, em parte devido à sua aparência invulgar e desajeitada de jovem intelectual ingénuo e perverso, e às suas intervenções imprevisíveis e desconcertantes, irónicas e irreverentes.
...faço parte da geração que viveu este lado do MEC ao vivo e a cores... O MEC e o Som da Frente do António Sérgio foram as portas para um mundo novo, inteligente e de extremo bom gosto... Esta singela homenagem ao Miguel Esteves Cardoso e um muito obrigado por nos teres trazido, visionário, a garantia das grandes bandas antes de elas o serem ... Thanks também por teres sido o catalisador em grande estilo de tudo aquilo que precisávamos para legitimar o nosso modo contra corrente de olhar as coisas e o mundo...
Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo.
O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.
Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço.
Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar.
O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende.
O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado,viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a Vida inteira, o amor não.
Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.
A verdade é um ideal tipicamente jovem, o amor, por seu turno, um ideal das pessoas maduras e daqueles que se esforçam por estar preparados para enfrentar a diminuição das energias e a morte. As pessoas que pensam só deixam de ambicionar a verdade quando se dão conta que o ser humano está extraordinariamente mal dotado pela natureza para o reconhecimento da verdade objectiva, pelo que a busca da verdade não poderá ser a actividade humana por excelência. Mas também aqueles que jamais chegam a tais conclusões fazem, no decurso das suas experiências inconscientes, um percurso semelhante.
Ter consigo a verdade, a razão e o conhecimento, conseguir distinguir com precisão entre o Bem e o Mal, e, em consequência disso, poder julgar, punir e sentenciar, poder fazer e declarar a guerra - tudo isto é próprio dos jovens e é à juventude que assenta bem. Se, porém, quando envelhecemos, continuamos a ater-nos a estes ideais, fenece a já se si pouco vigorosa capacidade de «despertar» que possuímos, a capacidade de reconhecer instintivamente a verdade sobre-humana.
A vossa alegria é a vossa tristeza mascarada. E o mesmo poço de onde sai o vosso riso esteve muitas vezes cheio de lágrimas. E como poderá ser de outra maneira? Quanto mais fundo a tristeza entrar no vosso ser, maior é a alegria que podereis conter. A taça que contém o vosso vinho não é a mesma que foi feita no forno do oleiro? E a lira que vos apanigua o espírito não é da mesma madeira com que foram esculpidas as facas?
Quando estiverdes alegres, olhai bem dentro do vosso coração e descobrireis que só aquele que vos deu tristezas vos dá também alegrias. Quando estiverdes tristes, olhai novamente para dentro do vosso coração e vereis que na verdade estais a chorar por aquilo que foi a vossa alegria. Alguns de vós dizeis, "A alegria é maior que a tristeza" e outros dirão "Não, a tristeza é maior". Mas eu digo-vos que são inseparáveis. Juntas vêm, e, quando uma se senta junto de vós lembrai-vos que a outra está a dormir na vossa cama. Na verdade, estais suspensos como balanças entre a vossa tristeza e a vossa alegria. Só quando vos esvaziais ficais em equilíbrio e imóveis. Quando o guardador de tesouros vos erguer para pesar o seu ouro e a sua prata, nem a vossa alegria nem a vossa tristeza se devem alterar.
Puxa não te via faz tempo, até pensei que tinhas ido de vez...
Sabes, não tinha saudades nenhumas tuas, nenhumas mesmo...mas já que estás por aqui que tal me dizeres de tua justiça?
O tempo quando não apareces parece que pára e que nada acontece, é a tranquilidade e quando penso nela agora na tua presença, é como se não tivesse nunca estado desassossegado ...
O antes da tua chegada tem um sabor a vazio, a algo que se dissipa facilmente....
Essa perene tranquilidade nem que dure muito tempo desfaz-se assim que reapareces...
Tu és mais sumarenta que qualquer bem estar corpóreo, tu preenches o sentir duma forma inigualável, apertas o coração como uma garra e dominas, submetes...
Vens de novo ter comigo para quê? Precisas como um piromaníaco de ver as almas a arder, bebes o sangue vital como um vampiro do espírito ... A arte, não é mais que uma forma criada por ti para retratar os desmandos que operas na mente de quem sente... Através dela materializas as tuas posturas implacáveis, mudas de aguilhão consoante o flanco se põe mais ou menos a jeito e cravas a amargura sem contemplações ... Quanto mais magoas mais expressão de sangue e lágrimas tem a obra que crias ...
Como se trocasses de máscaras numa peça de teatro surrealista, ris-te de nós, crias a confusão nos sentimentos e nas certezas improváveis ...
Depois apareces irado e blasfemas deitando fumo pelo nariz como uma máscara chinesa e nós inseguros nos encolhemos na nossa vontade...
Fazes com que tenhamos desprezo por nós próprios, pela nossa fraqueza humana e depois apareces cinicamente chorando como um palhaço triste...
Olhas-me frio e sem expressão, o que esperas para me abraçar?
Olha, sinceramente não precisas fazê-lo, não precisas mesmo...
Não tens de fazer nada, sou teu alimento!!
Afinal não basta só a tua presença para explicar tudo ?
Já sinto o chão a se liquefazer, não tarda e estarei nadando nas águas frias das tuas imposições, merda !!!
Ginsberg, mais um dos meus amados poetas malditos... Personagem de filme, mente fora do seu tempo, um guru no sentido da liberdade de ser-se, louco, visionário, contra-corrente, rebelde...
um pedaço do Uivo...
Eu vi as melhores cabeças da minha geração destruídas pela loucura, famintos histéricos nus, se arrastando na aurora pelas ruas do bairro negro na fissura de um pico, hipsters1 de cabeça feita anjos ardendo por uma conexão celestial e ancestral com o dínamo estrelado ancestral na maquinaria da noite, que pobreza e farrapos e olhos ocos e loucos sentaram fumando na escuridão sobrenatural dos apartamentos sem calafetação flutuando pelos tetos das cidades contemplando jazz, que despiram seus cérebros ao Céu sob o El 2 e viram anjos muçulmanos cambaleando sobre telhados e iluminados, que passaram por universidades com olhos serenos e radiantes alucinando Arkansas e tragédias de luz-Blake 3 entre os mestres de guerra, que foram expulsos de universidades por pirarem & publicarem odes obscenas nas vidraças do crânio, que se encolheram em quartos barbudos e de cuecas, queimando dinheiro em cestos de lixo e escutando o Terror pela parede, que levaram uma geral nos pentelhos voltando via Laredo 4 com um cinturão de maconha rumo a Nova York, que engoliram fogo em hotéis de quinta ou beberam terebentina no Beco do Paraíso 5, morte, ou purgatoriando seus torsos noite a noite com sonhos, com drogas, com pesadelos despertos, álcool e caralho e escrotos e fodas infinitas [...]
1 Hipster, gíria dos anos 40 para drogado e marginal.
2 El, ou “Elevated Train”, no original, refere-se ao elevado para o trem do metrô que existe em algumas cidades norte-americanas. El também é o nome hebraico para Deus.
3 Referência ao poeta e visionário inglês William Blake, com o qual Ginsberg teria tido uma alucinação em 1948.
4 Cidade texana que faz fronteira com o México.
5 Paradise Alley, Viela ou Beco do Paraíso, em Nova York. Referência ao lugar onde morava a prostituta Mardou Fox, do romance Subterraneans, de Jack Kerouac.
Quando parece que o mundo vai desabar, quando ficamos sem saber se amanhã cumpriremos nossos compromissos , pagaremos nossas contas, quando...
O dia seguinte nos surpreende, a situação afinal não é tão caótica, afinal até pagamos a maior parte do que devíamos, afinal até dá para relaxar um pouco, afinal...
Imprevisível é como se apresenta todo o incerto, o improvável é o que quase parece ser uma certeza...
Sonhando a vida improvisando soluções e planos, imberbes seres cósmicos, nos distraímos do essencial, nos perdemos na rotina do formigueiro... A estrela cadente ilumina o lago parado e pinta de prateado numa pincelada, aquela lambidela de luz, a sua passagem... Depois o lago fica reflectindo impávido a morosa efervescência da vida estrelar...
amo osThe The para além da música ou das letras... The The são alma, são cultura, são uma visão longínqua para além... o génio incompreensivelmente belo de Matt Johnson e a guitarra dos Smiths, Johnny Marr inventando muito... beyond love ...
Para o meu brother John, que se reintegrou de novo no Inominável ...
Ah nossa perene condição humana...
Somos pó das estrelas amassados numa argila baça, onde se não vislumbra o cintilar estrelar...
Sim, o sorriso inocente duma criança, sim , ele exprime a novidade, a descoberta, mas vamos evoluindo pela existência e a condição terráquea se começará a revelar...
Ela não pára de se afirmar mais e mais cruel, mais e mais rapace, mais e mais selecção animalesca das espécies!
...e o espírito?
ele que sente, ele que percebe a incompreensão...
Olha a matéria de que nós somos moldados e permanece flutuante...pairando no limbo do não saber
Habitante involuntário pergunta porque razão existe prisioneiro de um ser estranho, um ser com quem nos habituamos a conviver, de quem nos habituamos a perceber as imperfeições ?
Aleatoriamente somos moldados belos ou imperfeitos, chineses, indianos ou de outra característica diferente, inteligentes ou não.... Tal como numa fábrica, somos produtos acabados produtos série, ovos chocados na incubadora planetar , prontos para a experiência inexplicável de Gaia...
As recordações da juventude sobrevivem à decadência, ficam depois da morte prisioneiras numa fotografia ou numa canção em desuso...
Ser-se maduro é saber perceber que não somos pó nenhum das estrelas, somos sim entes incubados em argila ,aliens sem explicação...