quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Pessoa persistente...







                                            
















Não digas que o trabalho é desperdiçado, 

Nem que o esforço falha ou parece, no fundo; 
Não digas que aquele ao dever curvado 
É um entre os tantos sonhos do mundo. 

Pois não é em vão que em golpes seguidos, 
Com pressa medida, em fragor crescente, 
O mar actua nos rochedos batidos 
E invade a praia, ruidosamente. 










É certo que enfrentam suas investidas, 
Do seu bater forte parecem troçar, 
Esmagam com força as vagas erguidas 
E em espuma fazem as ondas rasgar. 

Mas ele bate e bate com força 
Em dias, semanas, em meses e anos, 
Até que apareça mossa sobre mossa 
Que mostre seus gastos, pacientes ganhos. 

E os anos passam, as gerações vão, 
E menores se quedam as rochas cavadas; 
Mas ele, com lenta e firme precisão, 
Baterá na terra suas altas vagas. 







Certo como o sol e despercebido 
Como duma árvore é o seu crescer, 
Trabalha, trabalha sem ser iludido 
P'la tenaz imagem que se pode ver. 

E quando o seu fim de todo obtém, 
Em sonoro embate, p'ra fender, se lança, 
Seu poder imenso ainda mantém 
E, inda mais além, nas águas avança. 

Alexander Search, in "Poesia"




domingo, 28 de outubro de 2012

Jazz no fim de Outubro
















Jazz...

existem palavras para dizer os sentires do peito mas melhor é que fiquem no silêncio, que  deixem as notas musicais escreverem o sentimento...

Jazz
























Jazz


 num solilóquio azul, borboletando por dentro a música pinta divagações e improvisos em telas  irrepetíveis...



Jazz

























Jazz

o lamento dos algodoais, a embriaguez nos bares de New Orleans , o chocalhar das correntes nos tornozelos, a voz dopada junto com o ronronar do saxofone e a guitarra  dizendo seriamente da alma


Jazz
























Jazz

misteriosa linguagem esta, feita a cada momento, recriando-se sempre a volta dum mantra harmonioso que nos emociona e vicia, nunca se repetindo


Jazz


domingo, 21 de outubro de 2012

Muquifo life - music by Alborosie










                                                 





Para  chegar ao Muquifo ele tem de descer umas escadas íngremes sob a sombra duma mangueira portentosa.

Abre o cadeado da grade de ferro, roda a chave da porta e o seu pedaço de intimidade lhe dá as boas vindas.

O melhor dos mais lindos palácios está ali, logo que a porta se fecha a tranquilidade e a segurança correm, saltitam, pulam para o seu colo felizes por o receberem ...

A geleira sorri-lhe, o pacote de waffers de baunilha a meio  ficou na mesa ,  repara que está tudo como gosta e como deixou ontem quando saiu para vadiar...

A mochila com o lap fica logo ali no sofá purpura da cozinha, já na casa de banho abre as torneiras  e tempera um banho morno...

A caminho do quarto vai tirando a t-shirt , acende a luz,  flita o quarto com o Baygon para garantir que mosquito algum lhe perturbe o sono e fica nu por dentro e por fora. 

Apetece-lhe ouvir Alborosie e começa a cantarolar  Dutty Road:
dem walk on dutty road, jah
full a garbage bin and cockroach, jah




As luzes do Muquifo iluminam esta actividade registando para a posteridade os movimentos do resgatado, a calma e o prazer  contidos em cada gesto rotineiro transformam a cena  num bailado em slow motion.
O banho vai até esgotar a água quente, nesse banho ele simplesmente deixa de estar e se concentra no prazer da massagem , como mãos oleosas e quentes a água o relaxa mais ainda...


Descalço e de toalha à cintura põe água a ferver para cozinhar um spaggheti  liga depois o lap ao sistema de som e Precious enche o espaço:


precious precious she's wining on me(lawd a mercy)
precious rub a dub mi girl till da morning
precious precious she's wining on me








Como as coisas simples podem ser tão prazeirosas e a convivência com ele próprio  tão reconfortante!!!
Depois de ter percorrido o deserto das almas penadas montado no faustoso camelo alado do acreditar, pensava ele conseguir chegar a terra do entendimento, descobre agora no ocaso da vida que  tal nunca poderia ter acontecido...

Percebe que não se pode chegar a lado nenhum se não conseguirmos primeiro resgatar o amor próprio.

O respeito em todos os  sentidos da palavra; a afirmação da nossa essência, da nossa personalidade sem  dúvidas.
Entendeu finalmente que não se pode  ser o que os outros gostariam que fossemos, que não podemos viver em função da vida dos outros .

Ele acredita que sendo assim, verdadeiro e seguro de si que  tudo ainda é possível.
O amor, a paz e até a felicidade poderão ainda acontecer ....  












O Muquifo fica  na entrada da zona  esquecida da cidade das acácias, fica ali onde a vida fervilha e as pessoas são feitas de luta e determinação, onde não existe espaço para lamentos, onde se cantam todas as odes à  vida, todos os dias  ...
A voz grossa de Alborosie sobe por entre os ramos da mangueira e consegue chegar ao último andar do prédio ao lado...

Ele dança ao som do reggae,  o molho a bolonhesa  já está quente, o resto do pacote de parmesão ralado ainda chega para esta refeição...

Enquanto dança de toalha a cintura agradece aos céus por ter sobrevivido, ele sente e sabe  que nunca mais será infeliz, que nunca mais ninguém lhe fará chorar....

O amor e o bem são invencíveis !!!!








domingo, 14 de outubro de 2012

Maputo blues - som de Mark Knopfler








                                            







 Maputo em tons azulados ...
 Na rua uma energia positiva vibra, um grupo de jovens na esquina  conversa animadamente, do outro lado da rua na barraca da mãmã Isabel um trio sentado no passeio bebe  e fala alto e as gargalhadas  animam  o fim do domingo...

Pardais voando no meio do cenário, carros circulando, muitos sons misturados, apetece estar aqui...




Maputo é bela, ela é especial e respira de modo totalmente diferente, não se compara a qualquer outro lugar, ela é ingénua e sorridente e todo mal que lhe estejam a fazer , nunca lhe tocará realmente, ela está noutro level...
O amor e paixão que ela desperta, a harmonia das ruas e das gentes, libertam um perfume de cidade mágica, cidade do impossível, cidade do óbvio, do ingénuo de novo....








Esta cidade que vaga em filosofias e estudos criativos tentando encontrar o cerne , querendo  desabrochar,  a contradição genuína que faz passar de 33º C  para 22ºC num piscar de olhos, o que se diz nem sempre ou quase nunca se faz, celebra-se o dia a dia e o fim de semana é uma festa, festeja-se como soi festejar-se em ocasiões especiais...









Maputo o jardim centenário , a cidade de traçado inteligente vai ressurgindo do coma, do desmazelo e se instruindo, vestindo-se melhor, sem pressa , lentamente, com seus filhos alheados , enfeitiçados pelos poderes da bela, pela magia apaziguadora que ela irradia, eles vão  inventando uma cidade de novo a se  iluminar....







Maputo blues, sonho contigo, nos meus sonhos estou sempre aqui, nas recordações, em todas as projecções vividas e por viver...
Maputo, meu sangue, meu amor incondicional, o   estar em casa, sensação única ....


















Último álbum do mestre dos Dire Straits, como o conhaque, maduro, apurado ....




quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Amy Whinehouse sempre ...








                                                           









Não me esqueço, não me canso, não paro de descobrir mais e mais Amy...












































terça-feira, 9 de outubro de 2012

O fim do nunca e do jamais










                                              







                                                                                                   
 para minha amiga do coração  Milene


Ela se olha no espelho e pergunta:
Espelho meu, quem é a mulher mais indesejada do mundo?
O espelho responde:
- Não é você loira, é sim aquela morena toda bem feita, de corpo escultural mas com uma cabeça de minhoca...
Neste mundo de gente pensante ela não vai nunca conseguir encontrar o amor, apenas será devorada e não sobrará nada para além desse corpo todo cansado e desgastado...
Mesmo assim ela se desanca e se descabela porque o espelho reflecte o exterior que ela não aceita, que ela não quer para si e triste e arrasada ela se fecha na sua concha e fica bebendo cachaça atrás de cachaça...
Sentada na areia da praia ela esconjura o mundo, ela grita e reclama dos céus e só o marulhar e o luar lhe respondem com ternura muda, com o calor das não palavras...
Os pirilampos se aproximam e a ajudam a se levantar e iluminada ela volta para seu castelo de sombras...
As lágrimas lhe toldam a visão e não consegue encontrar a morada.
- Onde está a minha guarida?
- Esta não é , mas...







No lugar de sua casa iluminada está uma carruagem feita de chocolate e ao se aproximar  a porta abre-se e um pajem belamente vestido lhe faz uma vénia e a convida a entrar.
Nervosa limpa com as costas da mão a face ainda molhada e receosa , querendo e não querendo se foi aproximando.
Sentada e com o coração batendo descomandado vê sair duma portinhola secreta um teclado e a janela á sua frente   se transformar num monitor incrível, tridimensional, touch screen, etc.
Um génio vai saindo tipo fumaça e se materializando bem ao seu lado, enorme e bem cheiroso, cheirando aos incensos do Oriente das mil e uma noites.
- Loira, vou lhe fazer 3 perguntas e você vai ter de responder certo senão não sairá daqui e voltará para seu mundo amargo e sem esperança.
- Se acertar vou levar você para a terra do nunca, para a terra do jamais se estar triste.
- Aceita ?
Enchendo o peito até quase explodir ela depois descomprime e o ar sai de seus pulmões com tanta força e libertando um bafo a cachaça que o  génio torce seu nariz e seus cabelos negros de azeviche esvoaçam cintilantes como só o  ébano perfeito dos mágicos o consegue.
Apontando o dedo para o monitor , magicamente surge a primeira pergunta escrita em 10 dimensões, nunca antes se tinha visto tanta tecnologia mágica  !!!
-O que é mais importante, o que você quer para sua vida ou o que a vida quer para você?
A loira sente o ar lhe faltando e a cabeça rodopiando e responde:
- O que eu quero para mim sem dúvida !!!

O sinal de certo surge piscando a verde  no écran e o cantar de rouxinóis acompanham o  banho de confetti de ouro real que vai caindo  do tecto.








A segunda pergunta não demorou.
- Devemos desistir de perseguir nossos anseios, nossos sonhos,  mesmo que tudo demonstre ser irrealizável  e devemos aceitar os factos que parecem intransponíveis?
Ah, a loira não acha que deva perseguir sonhos ou mesmo acreditar que tudo pode acontecer mas como ela tem um amigo que passa o tempo lhe atazanando com o contrário se resolve sem hesitar.
- Nunca, jamais desistir !!!! 
Um arco íris atravessa o céu sobre a carruagem e gazelas saltam por cima dos cavalos num espectáculo surreal, vozes angelicais cantam e afirmam:
" Acertou ! Acertou! 
Só falta mais uma ! Só falta mais uma !
A loira procura no bolso da saia rodada a garrafinha de cachaça e se assusta pois lá dentro em vez da garrafa tem sim um sapo gordinho sorrindo para ela
O génio se enrola numa espiral de fumo e volta para dentro do monitor e uma voz portentosa lhe lança a última pergunta:
- Loira, você acredita em contos de fada?

Aí a porca torce o rabo, ela se levanta e já vai para sair, deitando fogo pelas narinas, pensa ela  que está sendo alvo duma armação da televisão.
Abre a porta e se assusta porque está nos céus e as luzes da cidade estão pequeninas lá em baixo e se senta de novo rapidamente.
- Não, não acredito !!!
Grita rouca e consciente de que tudo vai terminar logo, que tudo não passa de uma alucinação etílica.









Um silencio gelado se instala e a carruagem se transforma num táxi velho e a caminho de sua casa que já se avista a alguns metros.
Paga a viagem e caminhando sem alento procura a chave que está pendurada num coração vermelho e não encontra, vira a carteira do avesso e nada....
- Perdi a chave e agora?
Desanimada empurra a porta e para seu espanto ela se abre sem ruído, sem o chiar nostálgico e tão conhecido do desconsolo de todos os dias...
Entra e repara que apesar de não ter ligado as luzes algo luminoso vem do seu quarto; em cima da cama a chave !!!
...mas no lugar do coração um papiro de ouro brilha com vida própria.
Senta-se na berminha da cama, receosa e sem perceber nada.
O papiro se começa a mover e um sábio, um ser feito de pureza extrema se materializa, vestido de tecidos nunca vistos.
Ele pega suas mãos com doçura e diz:
Moça, você respondeu tudo certo e como tal a vida não vai fazer você esperar mais, a vida não vai desapontar mais você, você vai ser amada e vai amar porque daqui para a frente o nunca e o jamais não existirão mais em sua vida
Não foi logo que esta declaração se tornou real mas a loira deixou de  acreditar que com ela o amor não aconteceria jamais.
 Passado uns tempos surgiu um individuo de carne e osso, belo e com cabelo preto como ébano, era  fã de suas palavras e de suas poesias e ela simplesmente arrumou o computador, só o ligava para saber de seus amigos.
O tempo era ocupado com a vida real, com a amizade e o amor, com o companheirismo e a alma acalmou e sossegou. 

...e foram felizes para sempre !!





músicas escolhidas pela Milene






quarta-feira, 3 de outubro de 2012

endoidada-mente são...







                                   









A loucura é só uma passagem discreta para o outro lado do espelho.
 Ela a loucura, quando chega faz-se sentir muito claramente, faz-se notar... 
 Basta para isso que ela comece a rondar pela vizinhança, sem demora dará o ar da sua graça...
 Logo se percebe no relógio , os ponteiros girando para trás.
O sono desaparecendo assim como a vontade de comer , o cérebro a 300 km por hora.
Os sentidos começam a descompassar e a claudicar , o corpo fica desgastado e cansado...
As ideias encadeiam-se e tu a assistires sem nada poderes fazer dentro da loucura que já te toma ...







A mão vai passando a ponta dos dedos através da  película do espelho, como na Banda Desenhada...
Do outro lado está frio e silencioso e apesar da mão não ouvir ele percebe cutaneamente que não existem sons do outro lado do espelho...
Não estou louco - pensa de si para si.
Estou sim a sofrer uma metamorfose... - conclui já com a cabeça espreitando o outro lado, o lado frio.








Ah, almas esgotadas!!!...

 É necessário  tão pouco para as fazer sorrir, a esse pouco para fazer sorrir a alma é que é mais difícil  se chegar !!

 Ela esfria e vira gelo ou então amarra uma mordaça e não fala mais, auto emudece.

Ela fica para explodir , ela se faz transbordar de mágoa, então fica mais perto da loucura
 ...se vai transformando em louco









segunda-feira, 1 de outubro de 2012

paraíso perdido ...












O bass dando o beat e o individuo seguindo a passo e compasso
gin e manga juice escorrendo para as meninges sedentas
o feriado deixou um trilho de musicas pela cidade e elas ficaram ecoando , ecoando...
na boca da toca o narizito empinado fareja o sentido das coisas




uma pontada nas costas lhe avisa da perenidade de estar
da penumbra olha o verde das folhas da majestosa mangueira em flor
os sons planam ao nível do tecto, ele está submerso

a terra o rodeia, os grilos grilam a meio tom, trinam...

na cave o solilóquio vai profundo e a escuridão se aproxima sorrateiramente...





Faça-se luz e a musica se pronuncie....

Lá onde os sonhos ficaram pendurados em varais, se abram as cortinas e deixem a noite ser plateia ...
Tambores tocando , os arautos das vidas perdidas se fazendo ouvir em harmonias complicadas, desenhando mapas e notas musicais nas histórias infames dos desconsolados.

Tacteando , inalando aromas, olhando longamente acaba o insone  provando o sabor salgado das coisas estáticas...

Coisas feitas de corações de pedra, de cores vivas escarradas no chão da ignomínia dos homens, lá onde não encontras o paraíso...
 Rebusca e busca e encontra o mesmo, nada...







Falar de coisas alegres, de sorrisos e beijos de amor, falar das mãos dadas na berma da praia, falar do brilho no olhar  de quem acredita, falar de ilusões, falar da espera eterna, falar em fé, falar...
Para quê fingir?
Lá na caverna, lá na toca, lá na cave a esperança tremeluz tal vela que pouco ilumina e o individuo não se agacha, não!!!
 Sai da toca e ao clarão da noite de néon  atira sarcástico e meio demente a pergunta lapidar:


 -Podes me indicar oh noite interminável,  como fazer para só vislumbrar um pouco desse tal de paraíso? 

Obviamente que a noite não lhe responde mas mesmo assim aguça o ouvido, não vá a noite sussurrar e ele não ouvir...





terça-feira, 25 de setembro de 2012

" - Please, play again for me Amy "





















Sentidos no âmago das cores dispersas, leves
são meus suspiros  e meus desassossegos sem rimas
misturando os sabores , diluindo as mãos nas mãos
encantando os olhares , olhares sem espelhos cristalinos
embaciados de lágrimas doces , pétala a pétala com cuidado
enquanto isso o vinho cor de sangue em vitral o copo torna
cantos sagrados de vozes dos deuses na terra, sem devoção
elevados aos píncaros da loucura não se despojam, nunca !!! 















 o pulsar do coração rimbomba dentro
 das praias ao longe a miragem grita surda
 enquanto sorrio para a lua amarelada em sépia
 deslavada foto encurvada como flores  secas de papel
 plantadas na soleira de cal ao sibilar dos pássaros da tarde
 a sombra dança ao sabor do vento, ao sabor
do amor que nunca acaba, brilha iridiscente e não fere... 











esses livros escolhidos , pedaços de almas nebulosas
despojos da dor e da lucidez são portas, são buracos negros
altares de flores brancas, de aguas perfumadas de incenso de jasmim
o mel e o bom whisky velho , as especiarias preferidas , o fumo
adocicados sabores e flautas de pan embalando os véus
no encontro dos sentidos somos ateus e inventamos cultos
lá, onde não se lembra mais nada fica a ilusão perfeita
fica o mistério do indizível,sossega a alma em alvoroço








domingo, 23 de setembro de 2012

Miguel Esteves Cardoso - o vero amor ...

                      



                                                                                                                                                       
                                    



A partir do contacto estreito com as bandas pós- punk e new wave da editora Factory, tais como Joy Division, New Order, Durutti Column ou The Fall, aquando da sua estada no Reino Unido, «MEC» (como era conhecido pelos fãs), deu-se a conhecer como autor de crónicas sobre música pop, publicadas nos jornais Se7e, O Jornal (actual Visão) ou Música & Som, avidamente lidas pelos jovens portugueses, em complemento à transmissão dessa música em programas como Rock em Stock, de Luís Filipe Barros, ou Rotação, Rolls Rock e Som da Frente, de António Sérgio, na Rádio Renascença e na Rádio Comercial.
Nessa época, dedicou-se também à crítica literária e cinematográfica, no Jornal de Letras, Artes e Ideias
Começou igualmente a ser presença assídua na rádio e na televisão, em parte devido à sua aparência invulgar e desajeitada de jovem intelectual ingénuo e perverso, e às suas intervenções imprevisíveis e desconcertantes, irónicas e irreverentes.



http://pt.wikipedia.org/wiki/Miguel_Esteves_Cardoso









...faço parte da geração que viveu este lado do MEC ao vivo e a cores...
O MEC e o Som da Frente do António Sérgio foram as portas para um mundo novo, inteligente e de extremo bom gosto...

Esta singela homenagem ao Miguel Esteves Cardoso e um muito obrigado por 
nos teres trazido, visionário, a garantia das grandes bandas antes de elas o serem ...
 Thanks também por teres sido o catalisador em grande estilo de tudo aquilo que precisávamos para legitimar o nosso modo contra corrente de olhar as coisas e o mundo...








Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo.
O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.
Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. 
Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?





O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar.
O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende.
O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado,viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a Vida inteira, o amor não. 
Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também. 

Miguel Esteves Cardoso, in 'Jornal Expresso'





quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Hesse abraça Gibran











A verdade é um ideal tipicamente jovem, o amor, por seu turno, um ideal das pessoas maduras e daqueles que se esforçam por estar preparados para enfrentar a diminuição das energias e a morte. 

As pessoas que pensam só deixam de ambicionar a verdade quando se dão conta que o ser humano está extraordinariamente mal dotado pela natureza para o reconhecimento da verdade objectiva, pelo que a busca da verdade não poderá ser a actividade humana por excelência.
Mas também aqueles que jamais chegam a tais conclusões fazem, no decurso das suas experiências inconscientes, um percurso semelhante.






Ter consigo a verdade, a razão e o conhecimento, conseguir distinguir com precisão entre o Bem e o Mal, e, em consequência disso, poder julgar, punir e sentenciar, poder fazer e declarar a guerra - tudo isto é próprio dos jovens e é à juventude que assenta bem. 
Se, porém, quando envelhecemos, continuamos a ater-nos a estes ideais, fenece a já se si pouco vigorosa capacidade de «despertar» que possuímos, a capacidade de reconhecer instintivamente a verdade sobre-humana.








A vossa alegria é a vossa tristeza mascarada.
E o mesmo poço de onde sai o vosso riso esteve muitas vezes cheio de lágrimas.
E como poderá ser de outra maneira?
Quanto mais fundo a tristeza entrar no vosso ser, maior é a alegria que podereis conter.
A taça que contém o vosso vinho não é a mesma que foi feita no forno do oleiro?
E a lira que vos apanigua o espírito não é da mesma madeira com que foram esculpidas as facas?








Quando estiverdes alegres, olhai bem dentro do vosso coração e descobrireis que só aquele que vos deu tristezas vos dá também alegrias.
Quando estiverdes tristes, olhai novamente para dentro do vosso coração e vereis que na verdade estais a chorar por aquilo que foi a vossa alegria.
Alguns de vós dizeis, "A alegria é maior que a tristeza" e outros dirão "Não, a tristeza é maior".
Mas eu digo-vos que são inseparáveis.
Juntas vêm, e, quando uma se senta junto de vós lembrai-vos que a outra está a dormir na vossa
cama.
Na verdade, estais suspensos como balanças entre a vossa tristeza e a vossa alegria.
Só quando vos esvaziais ficais em equilíbrio e imóveis.
Quando o guardador de tesouros vos erguer para pesar o seu ouro e a sua prata, nem a vossa alegria nem a vossa tristeza se devem alterar.





segunda-feira, 17 de setembro de 2012

essa velha presença garantida...










Olá !!!
Puxa não te via faz tempo, até pensei que tinhas ido de vez...
Sabes, não tinha saudades nenhumas tuas, nenhumas mesmo...mas já que estás por aqui que tal me dizeres de tua justiça?
O tempo quando não apareces parece que pára e que nada acontece, é  a tranquilidade e quando penso nela agora na tua presença, é como se não tivesse nunca estado desassossegado ...







O antes da tua chegada tem um sabor a vazio, a algo que se dissipa  facilmente....
Essa perene tranquilidade nem que dure muito tempo  desfaz-se assim que reapareces...
 Tu és mais sumarenta que qualquer bem estar corpóreo, tu preenches o sentir duma forma inigualável, apertas o coração como uma garra e dominas, submetes...





Vens de novo ter comigo para quê?
Precisas como um piromaníaco de ver as almas a arder, bebes o sangue vital como um vampiro do espírito ...
A arte, não é mais que uma forma criada por ti para  retratar os desmandos que operas na mente de quem sente...
 Através dela materializas  as tuas posturas  implacáveis, mudas de aguilhão consoante o flanco  se  põe mais ou menos a jeito e cravas a  amargura sem contemplações ...
Quanto mais magoas mais expressão de sangue e lágrimas  tem a obra  que crias ...






  Como se trocasses de máscaras numa peça de teatro surrealista, ris-te de nós, crias a confusão nos sentimentos e nas certezas improváveis ...
Depois apareces irado e blasfemas deitando fumo pelo nariz como uma máscara chinesa e nós inseguros nos encolhemos na nossa vontade...
  Fazes com que tenhamos desprezo por nós próprios, pela nossa fraqueza humana e depois apareces cinicamente chorando como um palhaço triste...






Olhas-me frio e sem expressão, o que esperas para me abraçar?
Olha, sinceramente  não precisas fazê-lo, não precisas mesmo...
Não tens de fazer nada, sou teu alimento!!
 Afinal não basta só a tua presença para explicar tudo ?
Já sinto o chão a se liquefazer, não tarda e estarei nadando nas águas frias das tuas imposições, merda !!!





terça-feira, 11 de setembro de 2012

Allen Ginsberg - Erotic Lounge 8









   





 Ginsberg, mais um dos meus amados poetas malditos...
Personagem de filme, mente fora do seu tempo, um guru no sentido da liberdade de ser-se, louco, visionário, contra-corrente, rebelde...








um pedaço do Uivo...


Eu vi as melhores cabeças da minha geração destruídas pela loucura, famintos histéricos nus, se arrastando na aurora pelas ruas do bairro negro na fissura de um pico,
 hipsters1 de cabeça feita anjos ardendo por uma conexão celestial e ancestral com o dínamo estrelado ancestral na maquinaria da noite,
que pobreza e farrapos e olhos ocos e loucos sentaram fumando na escuridão sobrenatural dos apartamentos sem calafetação flutuando pelos tetos das cidades contemplando jazz,
que despiram seus cérebros ao Céu sob o El 2 e viram anjos muçulmanos cambaleando sobre telhados e iluminados,
que passaram por universidades com olhos serenos e radiantes alucinando Arkansas e tragédias de luz-Blake 3 entre os mestres de guerra,
que foram expulsos de universidades por pirarem & publicarem odes obscenas nas vidraças do crânio,
 que se encolheram em quartos barbudos e de cuecas, queimando dinheiro em cestos de lixo e escutando o Terror pela parede,
que levaram uma geral nos pentelhos voltando via Laredo 4 com um cinturão de maconha rumo a Nova York,
 que engoliram fogo em hotéis de quinta ou beberam terebentina no Beco do Paraíso 5, morte, ou purgatoriando seus torsos noite a noite com sonhos, com drogas, com pesadelos despertos, álcool e caralho e escrotos e fodas infinitas [...]

 1  Hipster, gíria dos anos 40 para drogado e marginal.
 2  El, ou “Elevated Train”, no original, refere-se ao elevado para o trem do metrô que existe em algumas cidades norte-americanas. El também é o nome hebraico para Deus.
 3  Referência ao poeta e visionário inglês William Blake, com o qual Ginsberg teria tido uma alucinação em 1948.
 4  Cidade texana que faz fronteira com o México.
 5  Paradise Alley, Viela ou Beco do Paraíso, em Nova York. Referência ao lugar onde morava a prostituta Mardou Fox, do romance Subterraneans, de Jack Kerouac.

http://revistacult.uol.com.br/home/2010/11/o-uivo-vivo-de-allen-ginsberg/














O peso do mundo 
         é o amor. 
Sob o fardo 
       da solidão, 
sob o fardo 
      da insatisfação 

       o peso 
o peso que carregamos 
        é o amor. 

Quem poderia negá-lo? 
          Em sonhos 
nos toca 
      o corpo, 
em pensamentos 
        constrói 
um milagre, 
         na imaginação 
aflige-se 
         até tornar-se 
humano - 

sai para fora do coração 
         ardendo de pureza - 

pois o fardo da vida 
          é o amor, 

mas nós carregamos o peso 
           cansados 
e assim temos que descansar 
nos braços do amor 
          finalmente 
temos que descansar nos braços 
           do amor. 

Nenhum descanso 
        sem amor, 
nenhum sono 
        sem sonhos 
de amor - 
           quer esteja eu louco ou frio, 
obcecado por anjos 
           ou por máquinas, 
o último desejo 
          é o amor 
- não pode ser amargo 
         não pode ser negado 
não pode ser contigo 
           quando negado: 

o peso é demasiado 
          - deve dar-se 
sem nada de volta 
         assim como o pensamento 
é dado 
         na solidão 
em toda a excelência 
         do seu excesso. 

Os corpos quentes 
          brilham juntos 
na escuridão, 
          a mão se move 
para o centro 
        da carne, 
a pele treme 
          na felicidade 
e a alma sobe 
         feliz até o olho - 

sim, sim, 
           é isso que 
eu queria, 
          eu sempre quis, 
eu sempre quis 
         voltar 
ao corpo 
         em que nasci.










http://pt.wikipedia.org/wiki/Allen_Ginsberg

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

"The The" estar...








                        


Quando parece que o mundo vai desabar, quando ficamos sem saber se amanhã cumpriremos nossos compromissos , pagaremos nossas contas, quando...







O dia seguinte nos surpreende, a situação afinal não é tão caótica, afinal até pagamos a maior parte do que devíamos,  afinal até dá para relaxar um pouco, afinal...






  Imprevisível é como se apresenta todo o incerto, o improvável é o que quase parece ser uma certeza...








Sonhando a vida improvisando soluções e planos, imberbes seres cósmicos, nos distraímos do essencial, nos perdemos na rotina  do formigueiro...






A estrela cadente ilumina o lago parado e pinta de prateado numa pincelada, aquela lambidela de luz, a sua passagem...
 Depois o lago fica reflectindo  impávido a  morosa efervescência da vida  estrelar...







amo os The The  para além da música ou das letras...
The The são alma, são cultura, são uma visão longínqua para além...
o génio incompreensivelmente belo de Matt Johnson e a guitarra dos Smiths, Johnny Marr inventando muito...


beyond love ...



sábado, 25 de agosto de 2012

essa nossa condição...








                                         



                                                 





                              Para o meu brother John, que se reintegrou de novo no Inominável ... 



Ah nossa perene condição humana...
Somos pó das estrelas amassados numa argila baça, onde se não vislumbra o cintilar estrelar...

Sim, o sorriso inocente duma criança, sim , ele exprime a novidade, a descoberta, mas vamos evoluindo pela existência e a condição terráquea se começará a revelar...

Ela não pára de se afirmar mais e mais cruel, mais e mais rapace, mais e mais selecção animalesca das espécies!






...e o espírito?

ele que sente, ele que percebe a incompreensão...
 Olha a matéria de que nós somos moldados e permanece flutuante...pairando no limbo do não saber
Habitante involuntário pergunta porque razão existe prisioneiro de um ser estranho, um ser com quem nos habituamos a conviver, de quem nos habituamos  a perceber as imperfeições ? 
Aleatoriamente somos moldados belos ou imperfeitos, chineses, indianos ou de outra característica diferente, inteligentes ou não....
Tal como numa fábrica, somos produtos acabados produtos série, ovos chocados na incubadora planetar , prontos para a experiência inexplicável de Gaia...







As recordações da juventude sobrevivem à decadência, ficam depois da morte prisioneiras numa fotografia ou numa canção em desuso...
Ser-se maduro é saber perceber que não somos pó nenhum das estrelas, somos sim entes incubados em argila ,aliens sem explicação...
 Somos felizes, somos angustiados, somos desligados, somos encucados...
Existimos sim, aqui, em Gaia...
e depois?