As teias que envolvem o quadro escondido pelo tempo são como uma manta de filigrana
No fundo do sótão, por trás de móveis desconjuntados, da bola de basket careca de tantas partidas
A tela esquecida, na penumbra dos dias permanece guardando a história dum tempo, dum espaço...
Não feito o quadro de Dorian Gray, apenas se descascando imperceptível mente, devagar...
No dia em que se fez a mudança de casa, nesse dia ele seria relegado para o fundo do sótão
Esta casa do presente, já muito antiga, não tem nenhuma parede onde ele possa ser pendurado
Nenhum prego, nenhum acessório poderá suster o peso da pintura, as paredes liquefazem-se
Nesta casa a luz faz com que o azul do mar da tela se derrame qual maré pelo chão, pelos quartos
As gaivotas volteando por cima do barco artesanal ouvem-se pelos corredores, ah o calor...
O calor, a brisa do mar não chega para amenizar o torpor , o chão de madeira ferve, a areia queima..
Por dentro de nós passam mundos, passados, presentes e futuros, atropelam-se as noções elementares
O vivido, são camadas de vida vivida e em qualquer delas existimos intensamente, nos apaixonamos, nos angustiamos parecendo que só aquele presente existiu, são tantos presentes
Camada a camada vamos vivendo a vida vivida, fluindo...
O que se vive no presente, é apenas mais uma camada a acrescentar às outras, às que passaram
É o momento real, que nos envolve, que nos faz agir e que nos faz pensar no impalpável futuro
Ele virá, será presente e de imediato mais uma camada a sobrepor as outras...
A dimensão dos sonhos sonhados, das vontades, dos desejos, do que se imagina no cenário presente
Essa é a única dimensão que não se junta as camadas do tempo, a dimensão da mente
Ela projecta e desenha, pinta, ela representa só para ti, exclusivamente és tu e sonhas para ti
Dentro de nós estão mundos passados, presentes e futuros, atropelam-se as noções elementares
O viver transforma-se numa grande aventura, numa viagem de constantes revelações, materiais, etéreas, whatever, maravilha !