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domingo, 11 de novembro de 2012

Borges de novo ao Domingo...















Jorge Luís Borges escreve dum modo que me tira todo ensejo de tentar rabiscar minhas divagações, fico seco...
Hoje reli pela milésima vez,  poemas e trechos de um dos quatro volumes da sua antologia,  que são meus livros de cabeceira e me pasmo sempre com tanta sensibilidade, criatividade, erudição.
Todos atributos de grandeza se aplicam à obra deste génio do pensamento e das letras

















  















Num deserto lugar do Irão há uma não muito alta torre de pedra, sem portas nem janelas.
No único compartimento (cujo chão é de terra e tem a forma de um círculo) há uma mesa de madeira e um banco.
Nessa cela circular, um homem parecido comigo escreve em caracteres que não compreendo um longo poema sobre um homem que noutra cela circular escreve um poema sobre um homem que noutra cela circular...
O processo não tem fim e ninguém poderá ler o que os prisioneiros escrevem.




















Só uma coisa não há: e esta é o olvido.
Deus, que salva o metal, e salva a escória,
cifra em Sua profética memória
as luas que serão e as que têm sido.
Já tudo fica. A sequência infinita
de imagens que entre a aurora e o fim do dia
teu rosto nos espelhos deposita
e as que depois ainda deixaria.
E tudo é só uma parte do diverso
cristal desta memória: o universo.
Não têm fim os seus árduos corredores,
e se fecham as portas ao passares;
e só quando na noite penetrares,
do Arquétipo verás os esplendores.



























Não há-de te salvar o que deixaram 
Escrito aqueles que o teu medo implora; 
Não és os outros e encontras-te agora 
No meio do labirinto que tramaram 
Teus passos. Não te salva a agonia 
De Jesus ou de Sócrates ou o forte 
Siddharta de ouro que aceitou a morte 
Naquele jardim, ao declinar o dia. 
Também é pó cada palavra escrita 
Por tua mão ou o verbo pronunciado 
Pela boca. Não há pena no Fado 
E a noite de Deus é infinita. 
Tua matéria é o tempo, o incessante 
Tempo. E és cada solitário instante. 
















fotos da tribo do rio Om de Hans Silvester  .



segunda-feira, 23 de julho de 2012

Amy Whinehouse, um ano passou...






                                 
                                 





(...) A morte (ou a sua alusão) torna os homens delicados e patéticos.
Estes comovem-se pela sua condição de fantasmas. Cada acto que executam pode ser o último.
Não há um rosto que não esteja por se desfigurar como o rosto de um sonho.
Tudo, entre os mortais, tem o valor do irrecuperável e do perdido.
Entre os Imortais, pelo contrário, cada acto (e cada pensamento) é o eco de outros que no passado o antecederam, sem princípio visível, ou o claro presságio de outros que, no futuro, o repetirão até à vertigem.
Não há coisa que não esteja perdida entre infatigáveis espelhos.
 Nada pode ocorrer uma só vez, nada é primorosamente gratuito.
 O elegíaco, o grave, o cerimonial, não contam para os Imortais.
Homero e eu separamo-nos nas portas de Tânger. Creio que não nos despedimos. 

Jorge Luís Borges




































domingo, 8 de janeiro de 2012

Jorge Luiz Borges - music by Fun Lovin' Criminals










Soa um pouco  kitsh dizer que este ou aquele escritor é o preferido...
eu  sou fã incondicional, devoto de Borges, a obra a sua vida, o misticismo natural a sua volta
...como foi possível nunca lhe terem dado um Nobel?
não é realmente importante qualquer prémio, mas atendendo que se atribui esse galardão, onde estavam os neurónios e o espírito dos académicos, dos que  escolhem e decidem ?
A magia dos labirintos, dos tigres, dos espelhos,  a sua cultura e erudição, inigualável !!!








AS COISAS


A bengala, as moedas, o chaveiro,
A dócil fechadura, as tardias
Notas que não lerão os poucos dias
Que me restam, os naipes e o tabuleiro.
Um livro e em suas páginas a seca
Violeta, monumento de uma tarde
Sem dúvida inesquecível e já esquecida,
O rubro espelho ocidental em que arde
Uma ilusória aurora. Quantas coisas,
Limas, umbrais, atlas, taças, cravos,
Nos servem como tácitos escravos,
Cegas e estranhamente sigilosas!
Durarão para além de nosso esquecimento;
Nunca saberão que nos fomos num momento.








O Outro Poema dos Dons



Graças quero dar ao divino labirinto dos efeitos e das causas
pela diversidade das criaturas que formam este singular universo,
pela razão, que não cessará de sonhar com um plano do labirinto,
pelo rosto de Helena e a perseverança de Ulisses,
pelo amor que nos deixa ver os outros como os vê a divindade,
pelo firme diamante e a água solta,
pela álgebra, palácio de precisos cristais,
pelas místicas moedas de Angel Silésio,
por Schopenhauer que decifrou talvez o universo,
pelo fulgor do fogo que nenhum ser humano pode olhar sem um assombro antigo,
pelo acaju, o cedro e o sândalo,
pelo pão e o sal,
pelo mistério da rosa que prodiga cor e não a vê,
por certas vésperas e dias de 1955,
pelos duros tropeiros que, na planície, arreiam os animais e a alba,
pela manhã em Montevideu,
pela arte da amizade,
pelo último dia de Sócrates,
pelas palavras que foram ditas num crepúsculo de uma cruz a outra cruz,
por aquele sonho do Islão que abarcou mil noites e uma noite,
por aquele outro sonho do inferno, da torre do fogo que purifica e das esferas gloriosas,
por Swedenborg, que conversava com os anjos nas ruas de Londres,
pelos rios secretos e imemoriais que convergem em mim,
pelo idioma que, há séculos, falei em Nortúmbria,
pela espada e a harpa dos saxões,
pelo mar que é um deserto resplandecente e uma cifra de coisas que não sabemos e um epitáfio dos vikings,
pela música verbal da Inglaterra,
pela música verbal da Alemanha,
pelo ouro que reluz nos versos,




pelo épico Inverno,
pelo nome de um livro que não li: Gesta Dei per Francos,
por Verlaine, inocente como os pássaros,
pelo prisma de cristal e o peso de bronze,
pelas riscas do tigre,
pelas altas torres de S. Francisco e da ilha de Manhattan,
pela manhã no Texas,
por aquele sevilhano que redigiu a “Epístola Moral”e cujo nome, como ele teria preferido, ignoramos,

por Séneca e Lucano, de Córdova, que antes do espanhol escreveram toda a literatura espanhola,
pelo geométrico e bizarro xadrez,
pela tartaruga de Zenão e o mapa de Royce,
pelo odor medicinal dos eucaliptos,
pela linguagem, que pode simular a sabedoria,
pelo esquecimento, que anula ou modifica o passado,
pelo costume, que nos repete e confirma, como um espelho,
pela manhã, que nos depara a ilusão de um princípio,
pela noite, sua treva e sua astronomia,
pelo valor e a felicidade dos outros,
pela pátria, sentida nos jasmins ou numa velha espada,
por Whitman e Francisco de Assis, que já escreveram o poema,
pelo facto de que o poema é inesgotável e se confunde com a soma das criaturas e jamais chegará ao último verso e varia segundo os homens,
por Frances Haslam, que pediu perdão a seus filhos por morrer tão devagar,
pelos minutos que precedem o sonho,
pelo sonho e a morte, esses dois tesouros ocultos,
pelos íntimos dons que não enumero,
pela música, misteriosa forma do tempo.













http://pt.wikipedia.org/wiki/Jorge_luiz_borges