sábado, 19 de julho de 2014

Dalai Lama e o reggae de Chronixx









A um palmo de ser pleno e sendo-o já na sua plenitude interior,
o homem que planta naquele jardim as flores do adeus, espera...
Espera que ser feliz não seja uma doce quimera...

Acredita e sente que sim, que vai ser
Sabe que tem a tranquilidade e que só pode ser assim !!







Embora seja possível atingir a felicidade, a felicidade não é uma coisa simples. Existem muitos níveis. O Budismo, por exemplo, refere-se a quatro factores de contentamento ou felicidade: os bens materiais, a satisfação mundana, a espiritualidade e a iluminação. O conjunto destes factores abarca a totalidade da busca pessoal de felicidade. Deixemos de lado, por ora, as aspirações últimas a nível religioso ou espiritual, como a perfeição e a iluminação, e concentremo-nos unicamente sobre a alegria e a felicidade, tal como as concebemos a nível mundano. A este nível, existem certos elementos-chave que nós reconhecemos convencionalmente como contribuindo para o bem-estar e a felicidade. A saúde, por exemplo, é considerada como um factor necessário para o bem-estar. Um outro factor são as condições materiais ou os bens que possuímos. Ter amigos e companheiros, é outro. Todos nós concordamos que para termos uma vida feliz precisamos de um círculo de amigos com quem nos possamos relacionar emocionalmente e em quem possamos confiar.








Portanto, todos estes factores são causas de felicidade. Mas para que um indivíduo possa utilizá-los plenamente e gozar de uma vida feliz e preenchida, a chave é o estado de espírito. É crucial. Se utilizarmos as condições favoráveis que possuímos, tais como a saúde ou a riqueza, com fins positivos, para ajudar os outros, esses factores contribuem para uma vida mais feliz. 
Claro que, pessoalmente, também tiramos partido destas coisas —-facilidades materiais, sucesso, etc., mas se não tivermos a atitude mental correcta, se não cuidarmos do factor mental, estas coisas acabam por ter pouca incidência sobre o sentimento geral de felicidade. Por exemplo, se guardarmos ódio ou rancor no fundo de nós mesmos, isso acabará por destruir a nossa saúde, destruindo assim um dos factores. Por outro lado, se nos sentirmos infelizes ou frustrados, o conforto material não chegará para nos compensar. Mas se mantivermos um estado de espírito calmo e sereno, poderemos sentir-nos felizes mesmo se a nossa saúde não for das melhores. Em contrapartida, mesmo se possuirmos objectos raros ou preciosos, podemos querer deitá-los fora ou destruí-los num momento de grande cólera ou ódio. Nesse momento, os bens não significam nada para nós.








Existem actualmente sociedades com um grande grau de desenvolvimento material e no seio das quais muitos indivíduos não se sentem felizes. A nível superficial, essa abundância é muito atraente, mas por trás existe um desassossego mental que leva à frustração, a discórdias desnecessárias, à dependência das drogas ou do álcool e, no pior dos casos, ao suicídio. Não existe portanto nenhuma garantia de que a riqueza por si só possa trazer-nos a alegria ou a satisfação que procuramos. O mesmo se pode dizer dos amigos. Quando estamos muito zangados, mesmo um amigo muito próximo pode parecer-nos glacial, frio, distante e muito irritante. 
Tudo isto indica a enorme influência que o estado de espírito, o factor mental, pode ter na nossa vivência de todos os dias. Portanto, temos de ter esse factor seriamente em linha de conta. Independentemente de uma prática espiritual, mesmo em termos mundanos, a nossa capacidade de desfrutar de uma vida agradável e feliz depende da nossa serenidade mental. 
Talvez devesse acrescentar que quando falamos de um estado de espírito calmo ou de paz de espírito não devemos confundir isso com um estado de insensibilidade ou de apatia. Possuir um estado de espírito calmo não significa estar completamente alheado ou amorfo. A paz de espírito, esse estado de serenidade, tem de estar enraizado na afeição e na compaixão, o que implica um grande nível de sensibilidade e de sentimento.









Enquanto nos faltar a disciplina interior que conduz à serenidade, sejam quais forem as facilidades ou as condições exteriores que nos rodeiam, elas nunca nos trarão esse sentimento de alegria e de felicidade que procuramos. Por outro lado, se possuirmos as qualidades interiores de serenidade e de estabilidade, mesmo que os factores exteriores de conforto normalmente considerados como indispensáveis à felicidade não estejam em nossa posse, podemos ter uma vida alegre e feliz. 

Dalai Lama, in 'The Art of Happiness'












sexta-feira, 11 de julho de 2014

O Buddha na lucidez de Pessoa


















Ninguém a outro ama, senão que ama
O que de si há nele, ou é suposto.
Nada te pese que não te amem. Sentem-te
Quem és, e és estrangeiro.
Cura de ser quem és, amam-te ou nunca.
Firme contigo, sofrerás avaro
De penas.










Não só quem nos odeia ou nos inveja
Nos limita e oprime; quem nos ama
Não menos nos limita.
Que os deuses me concedam que, despido
De afetos, tenha a fria liberdade
Dos píncaros sem nada.
Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada
É livre; quem não tem, e não deseja,
Homem, é igual aos deuses.







Não queiras, Lídia, edificar no spaço
Que figuras futuro, ou prometer-te
Amanhã.  Cumpre-te hoje, não 'sperando.
Tu mesma és tua vida.
Não te destines, que não és futura.
Quem sabe se, entre a taça que esvazias,
E ela de novo enchida, não te a sorte
Interpõe o abismo?








Não quero as oferendas
Com que fingis, sinceros
Dar-me os dons que me dais.
Dais-me o que perderei,
Chorando-o, duas vezes,
Por vosso e meu, perdido.
Antes mo prometais
Sem mo dardes, que a perda
Será mais na 'sperança
Que na recordação.
Não terei mais desgosto
Que o contínuo da vida,
Vendo que com os dias
Tarda o que 'spera, e é nada




                                       





 





poesia de Fernando Pessoa